quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

Câmara Criminal susta julgamento do 2º. tribunal do júri de Natal em caso de delito antes da vigência da Lei 9271/96 [art. 366, CPP]. Entendeu-se que o paciente foi citado por edital e declarado revel, não se podendo aplicar a novel regra do atual art.420, parágrafo único, CPP, porque o paciente, durante a tramitação do feito, não teve ciência da acusação que lhe está sendo atribuída, constituindo-se tal situação uma exceção à regra da aplicação imediata da lei processual penal.



Pela nova sistemática processual (Art. 457, CPP), o julgamento não será adiado pelo não comparecimento do acusado solto  que tiver sido regularmente intimado. Ainda nos termos do art. 420, parágrafo único, CPP, o acusado solto que não for encontrado será intimado por edital (Incluído pela Lei nº 11.689, de 2008).
Desse modo, a Reforma Processual de 2008 permitiu  a submissão do réu pronunciado à sessão de julgamento no Tribunal do Júri, ainda que não tenha sido pessoalmente intimado.
Conforme reitera o STJ, “a Lei nova aplica-se imediatamente na instrução criminal em curso, em decorrência do princípio estampado no brocardo jurídico tempus regit actum, respeitando-se, contudo, a eficácia jurídica dos atos processuais já constituídos” (Superior Tribunal de Justiça STJ; HC 172.382; Proc. 2010/0086357-1; RJ; Quinta Turma; Rel. Min. Gilson Langaro Dipp; Julg. 24/05/2011; DJE 15/06/2011).
Para o STJ não há constrangimento ilegal na irretroatividade do art. 366 do CPP, com a redação alterada pela Lei n.º 9.271/96, para fatos ocorridos antes de 17.06.2006. Neste sentido segue a sua jurisprudência:
HABEAS CORPUS. ART. 19 DA LEI Nº 7.492/86. CONDENAÇÃO. ALEGAÇÕES DE INEXISTÊNCIA DE CRIME, FALTA DE PROVAS E FALTA DE JUSTA CAUSA. NECESSIDADE DE DILAÇÃO PROBATÓRIA. VIA INADEQUADA. INÉPCIA DA DENÚNCIA. TESE NÃO FORMULADA ATÉ A SENTENÇA CONDENATÓRIA. PRECLUSÃO. ART. 366 DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. LEI Nº 9.271/96. NOVATIO LEGIS IN PEJUS. IRRETROATIVIDADE. REVELIA. SUSPENSÃO DO PROCESSO E DO CURSO DO PRAZO PRESCRICIONAL. CRIME COMETIDO ANTES DA ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. ORDEM DENEGADA. 1. As teses que demandam análise aprofundada do conjunto fático-probatório não podem ser examinadas na via estreita do habeas corpus, conforme pacífico entendimento jurisprudencial desta Corte. Nesse sentido, as alegações de inexistência de crime, de falta de provas para a condenação e de falta de justa causa, nos termos ora deduzidos, são inviáveis de apreciação na via eleita. Destaque-se que o conjunto probatório foi bem cotejado pelas instâncias ordinárias, que concluíram pela condenação do paciente. 2. Conforme pacífica jurisprudência desta Corte, a inépcia da denúncia deve ser suscitada até a prolação de sentença, sob pena de preclusão. No caso em comento, tal alegação somente foi formulada no presente writ, não sendo analisada na sentença condenatória nem no acórdão da apelação. Assim, a matéria mostra-se alcançada pela preclusão. 3. A teor da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, não é possível a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, nos termos do vigente art. 366 do Código de Processo Penal, nos feitos relativos a crimes praticados antes da vigência da Lei nº 9.271/96, pois a suspensão do prazo prescricional constituiu novatio legis in pejus. Não se admite, ainda, a cisão da referida norma. 4. Muito embora a decretação da revelia tenha ocorrido na vigência da Lei nº 9.271, de 17.04.1996, que alterou a redação do art. 366 do Código de Processo Penal, constata-se que os fatos ora em apuração datam de 1985 a 1987, inexistindo, assim, constrangimento ilegal no prosseguimento do feito até a prolação de sentença condenatória. 5. Habeas corpus denegado. (Superior Tribunal de Justiça STJ; HC 98.763; Proc. 2008/0009744-5; RJ; Sexta Turma; Relª Minª Maria Thereza de Assis Moura; Julg. 16/03/2010; DJE 10/05/2010).

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO DUPLAMENTE QUALIFICADO. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. INCOMPATIBILIDADE COM A VIA ELEITA. CITAÇÃO POR EDITAL. SUSPENSÃO DO FEITO. FATOS ANTERIORES À LEI Nº 9.271/96, QUE DEU NOVA REDAÇÃO AO ART. 366 DO CPP. 1. A pretensão absolutória, calcada na fragilidade de provas, não se compatibiliza com a via estreita do habeas corpus, dada a necessidade de revolvimento do conjunto fático-probatório. 2. Consoante iterativa jurisprudência desta Corte e do Supremo Tribunal, as alterações produzidas pela Lei nº 9.271/96 ao art. 366 do CPP não se aplicam aos fatos ocorridos antes de sua vigência. 3. Ordem parcialmente conhecida e, nessa extensão, denegada. (Superior Tribunal de Justiça STJ; HC 168.043; Proc. 2010/0060124-0; RJ; Sexta Turma; Rel. Min. Og Fernandes; Julg. 19/05/2011; DJE 15/06/2011).

PROCESSO PENAL. HABEAS CORPUS. ROUBO MAJORADO. ACUSADOS CITADOS POR EDITAL. FATOS OCORRIDOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI N.º 9.271/96. ART. 366 DO CPP. IRRETROATIVIDADE. ORDEM DENEGADA. I. Não há constrangimento ilegal na irretroatividade do art. 366 do CPP, com a redação alterada pela Lei n.º 9.271/96, para fatos ocorridos antes de 17.06.2006, data da sua entrada em vigor. Precedentes. II. Inadmissibilidade de cisão da norma que dispõe sobre regras de direito processual e direito material, sob pena de prejuízo ao réu. III. As modificações ocorridas no art. 366 do CPP, pela Lei n.º 9.271/96, não se aplicam a fatos ocorridos anteriormente à sua vigência. lV. Ordem denegada. (Superior Tribunal de Justiça STJ; HC 158.824; Proc. 2010/0002110-9; RJ; Quinta Turma; Rel. Min. Gilson Langaro Dipp; Julg. 26/10/2010; DJE 22/11/2010).

No entanto, a Câmara Criminal do e. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Norte tem seguido linha mais garantista para admitir uma exceção à regra da aplicação imediata da lei processual penal quanto aos delitos praticados antes da vigência da Lei 9.271/96. Em um HC  recente, sustou-se o  julgamento de um caso do 2º. Tribunal do Júri da Comarca de Natal cujo delito fora praticado antes da vigência da Lei 9271/96 [art. 366, CPP]. Entendeu-se que o paciente fora citado por edital e declarado revel, não se podendo aplicar a novel regra do atual art. 420, parágrafo único, CPP, porque o paciente, durante a tramitação do feito, não teve ciência da acusação que lhe está sendo atribuída.
Vamos à íntegra da decisão:
HABEAS CORPUS Nº 2012.000904-3, DE NATAL
IMPETRANTE: BEL. ANA LÚCIA RAYMUNDO
PACIENTE: LUIZ RODRIGUES DIAS
AUTORIDADE COATORA: EXMº SR. DR. JUIZ DE DIREITO DA SEGUNDA VARA CRIMINAL DA COMARCA DE NATAL
RELATOR: TATIANA SOCOLOSKI (JUÍZA CONVOCADA)

EMENTA: HABEAS CORPUS LIBERATÓRIO – CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA - PRETENDIDO SOBRESTAMENTO DO FEITO E DA SESSÃO DE JULGAMENTO PERANTE O TRIBUNAL DO JÚRI – FATO DITO DELITUOSO OCORRIDO EM 30.12.1989, OU SEJA, ANTES DO ADVENTO DAS LEIS 9.271/96 E 11.689/98 – CITAÇÃO POR EDITAL – PACIENTE REVEL – NÃO APLICAÇÃO DAS NOVAS REGRAS CONSTANTES DO ART. 420, DO CÓDIGO PROCESSO PENAL – INTIMAÇÃO DA PRONÚNCIA VIA EDITAL – IMPOSSIBILIDADE - VIOLAÇÃO AO DIREITO DA AMPLA DEFESA – ULTRATIVIDADE DA NORMA PENAL - EXCEÇÃO À REGRA DA APLICAÇÃO IMEDIATA DA NORMA PROCESSUAL PENAL - NULIDADE DA INTIMAÇÃO DECRETADA – CONCESSÃO DA ORDEM.
No caso de suposto fato delituoso ocorrido no ano de 1989, ou seja, antes da vigência da Lei 9271/96, em que o paciente foi citado por edital e declarado revel, não se pode aplicar a novel regra contida no atual art.420, parágrafo único do Código de Processo Penal, cuja alteração foi dada pela lei 11.689/08, por afronta aos princípios da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal, eis que o paciente, durante a tramitação do feito, não teve ciência da acusação que lhe está sendo atribuída, constituindo-se tal situação uma exceção à regra da aplicação imediata da lei processual penal.

Vistos, etc.

DECIDE a Câmara Criminal, à unanimidade, em dissonância com o parecer do 16º Procurador de Justiça em substituição na 6ª Procuradoria, dr. Arly de Brito Maia, conceder a ordem, nos termos do voto da Relatora.

RELATÓRIO
A Defensora Pública Ana Lúcia Raymundo impetrou habeas corpus liberatório em favor de LUIZ RODRIGUES DIAS, qualificado, indicando coator o MM. Juiz de Direito da Segunda Vara Criminal da Comarca de Natal.
Aduz o impetrante que o paciente pode vir a sofrer constrangimento ilegal ao seu direito de locomoção, haja vista que foi intimado da decisão de pronúncia via edital, conforme preceitua a nova redação do art. 420, parágrafo único do Código de Processo Penal, com a redação dada pela Lei 11.689/2008, bem como foi aprazada data para sessão de seu julgamento perante o Tribunal do Júri.
Sustenta, ainda, que é acusado de crime praticado em 30 de dezembro de 1989, portanto, data anterior a vigência das Leis 9.271/1996 e 11.689/2008, devendo, assim, se aplicar a sua situação as normais processuais vigentes à época dos fatos.
Sustenta, ainda, que “(...)nunca foi ouvido judicialmente,tendo sido desde o início do tramite processual penal citado por edital (...)”, tendo ocorrido toda a instrução processual a sua revelia.
À inicial foram anexados os documentos de fls. 11/177.
Foram juntadas as informações prestadas pela autoridade impetrada às fls. 183/184.
Emitindo pronunciamento, o 16º Procurador de Justiça em substituição na 6ª Procuradoria, dr. Arly de Brito Maia, opinou pela denegação do writ (fls. 186/190).
É o relatório.

Trata-se de habeas corpus impetrado pela Defensora Pública Ana Lúcia Raymundo em favor de LUIZ RODRIGUES DIAS, qualificado, em que é apontado coator o MM. Juiz de Direito da Segunda Vara Criminal da Comarca de Natal.
Na inicial, o impetrante alegou que o paciente pode vir a sofrer constrangimento ilegal ao seu direito de locomoção, motivo pelo qual pede o sobrestamento da ação penal de n.º 0022315-51.2004.8.20.0001 a que o mesmo responde, bem como a suspensão da sessão de seu Julgamento perante o Tribunal do Júri, sob pena de violação ao princípio da ampla defesa.
Assiste razão o impetrante.
O suposto fato delituoso ocorreu em 30 de dezembro de 1989. O paciente foi ouvido pela autoridade policial em 18 de outubro de 1995, sendo intimado por edital dos demais atos processuais, tendo em vista haver sido decretada sua revelia, eis que foragido. A sentença de pronúncia foi proferida em 17 de outubro de 2011.
Desse modo, é notório que o dito crime se consumou antes de 1996, ou seja, quando se iniciou a vigência do artigo 366 do Código de Processo Penal, que instituiu a suspensão do processo, e do prazo prescricional, quando, em caso de citação por edital, o réu não comparecer à audiência de interrogatório, nem tão pouco constituir advogado.
E, conforme informação constante nos presentes autos, o paciente foi intimado de todos os atos processuais por edital, encontrando-se até os dias atuais foragido, ficando, portanto, o prosseguimento do feito condicionado à intimação pessoal da decisão de pronúncia, consoante preceitua a legislação vigente à época dos fatos.
No entanto, é forçoso reconhecer que com a reforma do Código de Processo Penal e a alteração das regras constantes em seu art. 420, a intimação da pronúncia de acusado solto que não for encontrado deve ser feita por edital e, com o trânsito em julgado de tal decisão deve ser designada data para o julgamento pelo Tribunal do Júri.
Dessa forma, a novel legislação não pode incidir em relação a fatos que tenham ocorrido anteriormente à vigência do art. 366, do Código de Processo Penal, que se deu com o advento da Lei 9.271/96.
Nesse sentido é a jurisprudência:
“Ementa: HABEAS CORPUS. PROCESSO DE COMPETÊNCIA DO TRIBUNAL DO JÚRI. FATO OCORRIDO EM 26.11.1994. CITAÇÃO POR EDITAL. REVELIA. DECISÃO DE PRONÚNCIA EM 05.06.1996. INTIMAÇÃO TAMBÉM VIA EDITAL. ADOÇÃO DA LEI 11.689/08. PRETENSÃO DEFENSIVA A QUE SE DÊ A INTIMAÇÃO PESSOAL PARA FINS DE SUBMISSÃO À JULGAMENTO PELO TRIBUNAL DO JÚRI. O fato em tela ocorreu antes mesmo da modificação do art. 366 do CPP, pelo qual, à época, citada por edital e não comparecendo ao interrogatório, era decretada a revelia da parte ré, prosseguindo-se o processo até o julgamento pelo Tribunal do Júri. Depois, com a alteração do art. 366 do CPP, que passou a vigorar em 17/06/96, citado o réu por edital e não constituindo advogado, deixando de comparecer à audiência de interrogatório, ficavam suspensos tanto o processo como o curso da prescrição, até a efetiva localização do acusado e seu comparecimento a juízo, podendo ser produzidas, todavia, provas consideradas urgentes. Tal dispositivo legal continua em plena vigência. Ocorre que com o advento da Lei 11.689/08, novo procedimento foi atribuído aos processos atinentes aos crimes dolosos contra a vida. Não mais se faz necessária a presença do acusado para o julgamento em plenário (art. 457), sendo permitida, inclusive, a sua intimação por edital da decisão de pronúncia se estiver solto e não for localizado (atual art. 420 do CPP). Por sua vez, a situação em tela teve origem em fato ocorrido no longíquo 26/11/94, quando não vigorava nem mesmo a atual redação do art. 366 do CPP. Logo, possível à época, a citação por edital com o desenrolar da ação penal. Ocorre que no caso em comento o paciente, a partir do que é possível apreender dos autos, nunca tomou conhecimento da ação penal instaurada contra ele, porquanto não foi citado pessoalmente - o que era possível de ser feito naquela época, reitere-se. Se levado a julgamento com base na atual redação do art. 457 do CPP - dispensa a presença do acusado devidamente intimado -, ter-se-á uma situação singular pela qual o paciente será julgado por seus pares sem nunca ter tido conhecimento, s.m.j., da ação penal antes instaurada contra si. Trata-se, assim, de ofensa ao princípio basilar da ampla defesa insculpido em nossa Constituição. Apreende-se, ainda, híbrida a norma trazida no atual art. 420 do CPP, uma vez que a mesma apresenta tanto conteúdo de direito material como de cunho processual, dependendo do cotejo entre a data do fato e as consequentes modificações legislativas. HABEAS CORPUS CONCEDIDO. LIMINAR RATIFICADA.” (Habeas Corpus Nº 70039776448, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Laís Rogéria Alves Barbosa, Julgado em 16/12/2010) (Grifos acrescidos).
“Ementa: CRIMES CONTRA A VIDA. PRONÚNCIA. INTIMAÇÃO PESSOAL. Fatos ocorridos antes da reforma do art. 366, e por consequência também antes da alteração do artigo 420, ambos do CPP. Réu citado por edital, e que ficou revel. Inaplicabilidade da nova regra do art. 420. Indispensável intimação pessoal da sentença de pronúncia. Preservação do direito constitucional à ampla defesa. ORDEM CONCEDIDA. POR MAIORIA.” (Habeas Corpus Nº 70040419285, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em 10/02/2011) (Grifos acrescidos).
Com efeito, na data do fato (1989) estava em vigor os arts. 413 e 414 do Código de Processo Penal, cuja redação é sem dúvida mais benéfica ao paciente. Não obstante, entendo que tal legislação possui ultra-atividade em relação aos fatos ocorridos anteriormente à vigência da Lei 11.689/2008.
Pois bem. O atual art. 420 do diploma processual penal, ao estabelecer, para o réu solto que não for encontrado, a intimação por edital da decisão de pronúncia, impõe regra bem mais restritiva ao direito do contraditório e da ampla defesa, que a vigia anteriormente. Em assim sendo, com a intimação da pronúncia por edital e o prosseguimento do feito, o pronunciado será submetido a julgamento pelo Tribunal do Júri, sem sequer conhecer a acusação a que responde, estando ele presente ou não a sessão.
A respeito da matéria, Luiz Flávio Gomes, Rogério Sanches Cunha e Ronaldo Baptista Pinto, na obra Comentários às reformas do Código de Processo Penal e da Lei de Trânsito, editora RT, 2008, p.91, assim se manifestaram:
"Exceção: caso o acusado tenha sido citado por edital, antes de 1996 (época da reforma do art. 366 do CPP, viabilizada pela Lei 9271/96), e não tenha sido cientificado da peça acusatória, nesse caso, se o processo estava parado em razão de ele não ter sido encontrado, não pode o feito ter andamento, porque o réu não tomou ciência (lá no início) da acusação. Esse é o direito fundamental que deve ser respeitado: ciência do inteiro teor da acusação (nos termos do que está garantido pelo art. 8º, 2, b, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos). Sem isso nada pode andar. Nos crimes ocorridos depois de 1996 já tem incidência o art. 366 do CPP: o processo está suspenso. Nos crimes anteriores os processos tiveram andamento, mas muito deles encontraram o obstáculo da intimação pessoal da pronúncia (que era obrigatório, antes, em relação aos crimes inafiançáveis). É justamente nesses casos específicos que devemos respeitar a exceção: a eles não podemos aplicar a nova regra da intimação da pronúncia por edital, porque esses réus não tomaram ciência da peça acusatória.”
Ora, o Magistrado na aplicação das leis deve obediência aos direitos e garantias fundamentais do acusado, não podendo violar princípio processuais, dentre os quais se inclui a retroatividade da norma mais gravosa a fatos pretéritos. Sendo assim, entendo que, no caso em análise, a intimação do paciente deve ser feita pessoalmente, se aplicando, então, a regra do antigo art. 414, do Código de Processo Penal.
Ademais, o art. 2º, do Código de Processo Penal que reza que as leis processuais terão aplicação imediata, não se aplica aos presentes autos, haja vista que, conforme se pode concluir através das informações constantes no caderno processual, o paciente foi intimado via edital de todos os atos processuais, vez que decretada sua revelia, eis que foragido, não tomando, assim, conhecimento da acusação que lhe é feita, o que configura violação aos princípios constitucionais da ampla defesa, do contraditório e do devido processo legal.
De tal entendimento não diverge a jurisprudência:
“HABEAS CORPUS - CRIME DOLOSO CONTRA A VIDA - CRIME OCORRIDO EM 1982 - RÉU CITADO POR EDITAL ANTES DA REFORMA DETERMINADA PELA LEI 9271/96 - INTIMAÇÃO DA PRONÚNCIA POR EDITAL - IMPOSSIBILIDADE - EXCEÇÃO À REGRA DA APLICAÇÃO IMEDIATA DA LEI PROCESSUAL PENAL - NULIDADE DA INTIMAÇÃO DECRETADA. Em se tratando de crime ocorrido antes da vigência da Lei 9271/96, em que o réu, citado por edital, foi declarado revel, não se pode aplicar a nova disposição trazida ao art.420, parágrafo único do CPP, dada pela lei 11.689/08, que determina a intimação por edital da decisão de pronúncia, por ferir o princípio da ampla defesa, vez que o réu em nenhum momento teve ciência da acusação que pesava contra sua pessoa, erigindo-se uma exceção à regra da aplicação imediata da lei processual penal.” (TJMG, Número do processo: 1.0000.09.498700-5/000, Relatora:  Desª Maria Celeste Porto, Data da Publicação:08/09/2009) (Grifos acrescidos). 
Outrossim, diante de todos os argumentos aqui aduzidos, entendo que a intimação por edital da decisão de pronúncia, caracteriza afronta ao direito de defesa, eis que o prosseguimento do feito, com a submissão do paciente ao plenário do júri, poderá acarretar-lhe grande prejuízo.
Ante o exposto, defiro a ordem, anulando a intimação do paciente da decisão de pronúncia, vez que realizada via edital, e os atos subsequentes.
É como voto.
Natal, 16 de fevereiro de 2012.





Desembargador RAFAEL GODEIRO
Presidente




Doutora TATIANA SOCOLOSKI (Juiza Convocada)
Relatora




Doutora MARIA AUXILIADORA DE SOUZA ALCÂNTARA
5°. Procuradora de Justiça

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