quinta-feira, 2 de abril de 2009

Bullyng e violência de gênero: tudo a ver


O Juiz Potiguar Renato Vasconcelos Magalhães presenteia-nos com um artigo que aborda um tema caro para a criminologia contemporânea.
Renato percebe a  relação íntima e inevitável entre bullyng e a violência de gênero. O bullyng continua sendo um tema pouco visitado pelo Direito em Geral e especialmente pelo Direito de Família  e  outros ramos relacionados. Daí a importância do texto.
Vamos logo ao artigo:

 
O BULLYING COMO MANIFESTAÇÃO DE GÊNERO

 

 
 Renato Vasconcelos Magalhães
Juiz de Direito
Doutor em Direito
Coordenador do Núcleo de Estudos sobre Violência de Gênero - NEVIG
Vice-Presidento do Forum Permanente de Juizados da Violência Domestica e Familiar contra a Mulher


            Um novo termo (ainda sem tradução no Brasil) surge para designar um antigo fenômeno já por todos conhecidos, principalmente no ambiente escolar, o Bullying. Inicialmente estudado nos países anglo-saxões, compreende atos de violência física, moral ou psicológica, praticados de forma intencional e reiterada contra uma pessoa ou grupo de pessoas em situação desigual de poder, causando-lhes sofrimento e dor. Dentro de um amplo espectro de ações praticadas  pelo agente (bully) teríamos: amedrontar, ignorar, intimidar, humilhar, zoar, apelidar, dominar, empurrar, etc.
            Primeiro observado em ambientes escolares onde, de fato, o número de casos é, infelizmente, cada vez maior, sabe-se, hoje, que o bullying não é praticado exclusivamente em escolas e por estudantes. Uma considerável parcela deste fenômeno tem ocorrido também em ambientes de trabalho ou lazer. Na verdade, o bullying, ainda que se tenha percebido a prevalência de incidência em determinados espaços, ocorre indistintamente do local,  do grupo social ou da faixa etária.
            O bullying pode estar associado a diversas causas e não se confunde com o ato praticado. O fenômeno ultrapassa os limites da percepção isolada da ação que pode receber um tratamento penal como é o caso da lesão corporal, da injúria, do dano, etc; ou não, como é o caso do mobbing. Não obstante a tipificação penal que se aloque a uma conduta praticada pelo agente, o fenômeno deve ser visto em uma outra perspectiva, onde se contemple tanto a motivação psicológica do agente, quanto a relação interpessoal com o seu alvo, tendo como pano de fundo a estrutura social de poder em uma sociedade vincada por uma necessidade/exigência simbólica de afirmação da diferença (de gênero, raça/etnia, educação, orientação sexual, etc.).
            Neste sentido, é possível contemplar o bullying dentro de uma sociedade que contemporiza com diversas formas de discriminação, adotando posturas lenientes em relação a desigualdade de poder, que sintomatizam ações violentas. O bullying, portanto, pode ser contemplado através de um recorte de gênero, ou seja, de uma visão modelada pela perspectiva hegemônica de masculinidade decorrente de estruturas simbólicas (desiguais) de poder entre os sexos.
            As condutas que matizam parcela do bullying possuem as cores da discriminação, da prepotência, da arrogância de gênero, que se dão tanto em ambientes escolares quanto laborais e de lazer. E, uma vez que a legislação protetiva da mulher (Lei Nº 11.340/06) irradia seus efeitos somente às situações de violência de gênero ocorridas em ambiente doméstico, familiar ou em decorrência de relações íntimas de afeto (art. 5º), o estudo do bullying de gênero no Brasil adquire considerável importância já que se trata de uma porta, ainda aberta, para a violência de gênero contra a mulher. 

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