sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Decisão histórica no STF: o princípio da não-culpabilidade é absoluto. Doutrina comemora. E a sociedade? Impunidade valorizada?


Ontem, o STF deu uma nova interpretação para o princípio da não-culpabilidade. Efetivamente, entendeu o tribunal pleno que alguém somente deve iniciar o cumprimento da prisão depois do trânsito em julgado da decisão condenaria, não havendo que falar-se em execução provisória de sentença penal, exceto havendo necessidade de prisão preventiva, uma vez preenchidos os requisitos legais.


Joaquim Barbosa destacou que a decisão tira o prestígio das instâncias ordinárias, competentes para apreciar o fato, além de que favorece que as partes interponham mais recursos, aproveitando-se do acúmulo das instâncias superiores. Barbosa seguiu o seu voto em favor da efetividade, sinalizando que o princípio da não-culpabilidade não é absoluto e que em nenhum país democrático aguarda-se o último recurso para iniciar-se o cumprimento da pena. O Ministro ainda chegou a perguntar por que não deixar que todas as causas penais fossem decididas no Supremo.


Em sentido contrário, entendendo pela aplicação absoluta do princípio da não-culpabilidade, destacaram os Ministros que o Art. 105 da Lei de Execução (transitando em julgado a sentença que aplicar pena privativa de liberdade, se o réu estiver ou vier a ser preso, o Juiz ordenará a expedição de guia de recolhimento para a execução) não faz exceção às instâncias especiais, ou seja, somente depois do efetivo trânsito em julgado é que se deve expedir a guia de recolhimento.


O Min. Celso de Mello ainda destacou que Art. 594, CPP (o réu não poderá apelar sem recolher-se à prisão, ou prestar fiança, salvo se for primário e de bons antecedentes, assim reconhecido na sentença condenatória, ou condenado por crime de que se livre solto) foi revogado pela Lei nº 11.719, de 2008, o que sinalizou o legislador pela não obrigatoridade do recolhimento da prisão.


Quanto ao argumento do favorecimento da impunidade, o Min.Celso de Mello disse que isto foi atenuado com a Lei nº 11.596, de 2007, que deu nova redação ao art. 117 do Código Penal para incluir o acórdão condenatório como uma das causas de interrupção da prescrição.

Para refletir, finalizo então com Jean Cruet (1908):

"Nâo ha pois, a nosso ver, senão um meio para conhecer a lei e comprehender a legalidade, é estudar as leis como phenomenos historicos e sociaes, nos seus caracteres observaveis".


***

Para saber mais detalhes, vamos à reportagem de Andréia Henriques:


O STF (Supremo Tribunal Federal) reafirmou nesta quinta-feira (5/2), por sete votos a quatro, a possibilidade de que um réu condenado possa recorrer em liberdade até o trânsito em julgado da sentença —quando não cabem mais recursos. De acordo com o Supremo, um réu condenado em primeira instância só será preso após a condenação final.


A decisão, aplicada a um processo específico, deverá influenciar e se tornar referência para futuras decisões do Supremo em casos semelhantes.


O entendimento do plenário do STF não livra da cadeia os réus que tenham prisão temporária devidamente justificada pelo juiz. Leia aqui os requisitos necessários para fundamentar a prisão preventiva.


O tema foi discutido no habeas corpus de Omar Coelho Vitor contra decisão do STJ (Superior Tribunal de Justiça). O réu, condenado por tentativa de homicídio em Minas Gerais, pedia a suspensão da execução de sua pena, ou seja, que ele não fosse preso até esgotarem todos os recursos possíveis contra sua condenação.


Leia mais:

Decisão é positiva tanto para pobres quanto para ricos, diz ex-juiz


Classificado como histórico por alguns ministros, o julgamento foi marcado por discussões. Joaquim Barbosa afirmou que o Supremo teria que assumir o ônus político da decisão. "Queremos um sistema penal eficiente ou um sistema de faz-de-conta?", questionou Barbosa, afirmando ainda não existir nenhum país no mundo que ofereça "imensas e inigualáveis" opções de proteção como o Brasil.


Para o presidente da Corte, ministro Gilmar Mendes, o sistema penal e carcerário vive um "mundo de horrores" que, muitas vezes com a conivência do Judiciário e do Ministério Público, permite atrocidades. Ele citou o caso de um suspeito preso por três anos sem que o MP oferecesse denúncia.


"A Constituição garante a presunção de inocência até o trânsito em julgado. Antes disso, a prisão deve ser fato excepcional", disse o ministro Ricardo Lewandovski.


Abalos irreversíveis

Carlos Ayres Britto, ao concordar com a concessão do habeas corpus, afirmou que a prisão sem a condenação final causa abalo psíquico, desprestígio familiar e social e desqualificação profissional, danos tão graves quanto irreparáveis.


"Um homem não pode ser chamado de culpado até a condenação em definitivo. Isso seria uma ofensa às garantias constitucionais. A dignidade da pessoa humana deve ser mantida", complementou Cezar Peluso.


"Até uma criança é capaz de se rebelar contra uma decisão injusta. Sem juízo definitivo de culpa, uma decisão é tudo, menos legal e justa", disse o vice-presidente do Supremo.


Os ministros ainda afirmaram que a decisão é fundamental para que não ocorram erros e situações irreversíveis com a conivência do Judiciário.


Discórdia

Para o ministro Joaquim Barbosa, não se deve fazer "letra morta" das decisões das instâncias ordinárias, sob o risco de que todas as ações penais tenham que ser julgadas pela Suprema Corte. "Adotar a tese de que o réu possa recorrer em liberdade causará um estado de impunidade e aumentará a sobrecarga do Judiciário e do Supremo", disse o ministro.


Ele ainda afirmou que a decisão do Supremo servirá especialmente para aqueles que dispõem de defensores que tenham como único objetivo utilizar o maior número de recursos possíveis, levando casos à prescrição sem que se tenha condenação final.


Ellen Gracie afirmou na sessão desta quinta que a tese de que só o trânsito em julgado levaria o réu à prisão poderia fazer com que ninguém fosse preso no Brasil.


Os ministros lembraram que existem criminosos confessos condenados em primeira e segunda instâncias e que, mesmo assim, não vão para a cadeia.


O relator do processo, ministro Eros Grau, já havia votado pela concessão do habeas corpus. Seguiram esse entendimento os ministros Celso de Mello, Cezar Peluso, Ricardo Lewandovski, Carlos Ayres Britto, Marco Aurélio e Gilmar Mendes, presidente da Corte.


Carlos Alberto Menezes Direito, que havia pedido vista do processo, entendeu que não existia impedimento para o cumprimento da prisão, sendo seguido pelos ministros Cármen Lúcia, Joaquim Barbosa e Ellen Gracie.


Quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009



FONTE: http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/61818.shtml

Para saber mais; http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=102869&tip=UN

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