quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

Victor Nunes Leal

Sexta-feira, 16 de Janeiro de 2009
Victor Nunes Leal: Militares tiraram a toga do inventor das súmulas
Os servidores do Supremo Tribunal Federal (STF) diariamente deparam com o nome de Victor Nunes Leal. A biblioteca do órgão, que reúne cerca de 90 mil títulos (a maioria sobre Direito Constitucional), foi batizada em homenagem ao ministro. Não é a única: o centro de estudos da Advocacia Geral da União e outras bibliotecas de Direito em todo o País também estampam o nome do advogado e jornalista.

Victor Nunes era o vice-presidente da Corte quando foi forçado a se aposentar, junto com outros dois magistrados, por ordem do governo de Artur da Costa e Silva. O Ato Institucional 5 (AI-5), em 13 de dezembro de 1968, deu ao marechal poderes irrestritos de ingerência no Legislativo e no Judiciário: ele fechou o Congresso Nacional e suspendeu direitos políticos e garantias individuais, por exemplo.

Com base no AI-5, a presidência da República editou, no mês seguinte, o decreto que encurtaria a magistratura de Victor Nunes Leal e o levaria de volta à advocacia. O motivo seria a suposta “independência” dele em relação aos julgamentos – muitas vezes considerados desfavoráveis à Revolução. Além disso, Victor Nunes foi nomeado ao cargo pelo ex-presidente Juscelino Kubitschek, que não tinha o apreço dos militares.

Ele desafiou o regime em algumas decisões, como a que considerou os Atos Institucionais categoria inferior às normas escritas na Constituição vigente, a de 1967. “Não pode haver, no regime constitucional, um outro sistema de normas que o STF tenha de aplicar contra a letra e o espírito da Constituição”, disse no seu voto.

Ele também avaliou que o Supremo – e não a Justiça Federal – deveria julgar, por crimes comuns, o ex-presidente João Goulart, cujos direitos políticos e prerrogativas de foro haviam sido suspensos pelo AI-2.

Na opinião do atual presidente do STF, ministro Gilmar Mendes, o fato de Nunes ter sido aposentado em tempos autoritários “nada mais fez do que valorizar o seu currículo”. A opinião é compartilhada pelo tributarista Ives Gandra Martins e pelo jurista Arnoldo Wald. Em artigo assinado por ambos, em 2006, eles escreveram que “a presença de Victor Nunes Leal, com sua vivência de advogado e sua preocupação de manter a coerência e a segurança jurídica, marcou a história do Supremo”.

Decisões

Mesmo com a carreira no STF encurtada, ao longo dos oito anos em que esteve na corte participou de aproximadamente 10 mil acórdãos, nos quais trouxe contribuições principalmente nas áreas de Direito Constitucional e Direito Administrativo em julgamentos históricos. Entre eles estão os que definiram as regras de impeachment de governadores de estado (HC 41296), a autonomia municipal para edificações urbanas (Representação 775), a majoração de tributos (Representações 494 e 505) e os conflitos entre lei orgânica de municípios e lei de criação deles – todas decisões anteriores à Carta atual.

Victor Nunes também relatou importantes questões de direito internacional. Nos pedidos de extradição de Franz Paul Stang feitos por Alemanha, Áustria e Polônia (países que o acusavam de genocídio no regime nazista), ele votou pela entrega de Stang com a garantia de que a sua condenação não ultrapassasse a pena máxima da lei brasileira para crime semelhante praticado aqui.

no pedido de extradição do soldado cubano Arsênio Pelayo Bravo, fiel às tropas do presidente deposto por Fidel Castro, o ministro negou a entrega do militar destacando a possibilidade de o julgamento ser feito por um tribunal de exceção do regime castrense e de Arsênio ser condenado à morte, como foram seus companheiros. A proteção foi estendida por unanimidade pelo tribunal ao cidadão cubano.

O presidente da OAB-SP, Luiz Flávio Borges D'Urso, aponta Victor Nunes como o responsável por introduzir o instrumento que sintetiza a jurisprudência do tribunal em súmulas. “Tendo ele mesmo afastado a idéia de tirá-las do caráter de predominante para convertê-las em vinculante”, explica D´Urso, um crítico do efeito vinculante desses enunciados.

Já o ministro aposentado José Paulo Sepúlveda Pertence – um dos maiores estudiosos sobre a vida e obra de Nunes – reitera a importância da passagem do ministro pelo órgão de cúpula do Judiciário dizendo que ele foi “propulsor das inovações mais profícuas nos métodos de trabalho do Tribunal com o que Victor dá testemunho da sua preocupação obsessiva de ver a justiça como um serviço público antes de mais nada”.

Na cerimônia de instalação do Centro de Estudos da AGU, Pertence destacou que nos anos conturbados que sucederam ao Golpe Militar de 1964, Leal Nunes exerceu o papel “de advogado do tribunal perante a opinião pública, em oposição às tentativas de reformas castradoras da independência do Tribunal”. Leia a íntegra do discurso de homenagem feito por Pertence na ocasião.

Obras literárias

“Coronelismo, Enxada e Voto”, publicado em 1948, é a obra mais conhecida de Victor Nunes, à qual Sepúlveda Pertence se refere como “um marco divisório dos estudos da ciência política no Brasil e do seu cultivo universitário”.

Por outro lado, no artigo “Os Desafios do Judiciário”, o ex-Procurador-Geral da República Geraldo Brindeiro aponta o livro "Problemas de Direito Público", também escrito por Victor Nunes Leal, como “obra clássica na literatura jurídica pela relevância dos temas (constitucionais e de direito público) e pela densidade doutrinária e jurisprudencial”.

FONTE: STF; MG/EH//AM


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