sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Sobre homens que abraçam árvores e causas

1 07 2008
Numa conversa amigável, disse-me Jessé que José de Sousa, pai de José Saramago, ao pressentir a chegada de sua própria morte, despediu-se das árvores do jardim de sua casa, abraçando-as carinhosamente. O ato ingênuo de José de Sousa não somente revela a altivez deste homem, mas igualmente tem tudo a ver com uma vida de igualdade entre todos os seres da terra.
Já tratei da igualdade entre todos os seres da terra numa postagem anterior (Juiz proíbe pesquisas com animais), na qual abordei a objeção de consciência, mas vou aqui desenvolver o tema um pouco mais…
Fiquei pensando… Talvez José de Sousa tenha se inspirado em HENRY DAVID THOREAU (1817-1862).
O ato do pai de Saramago remete a uma forma de pensar que vai em direção à filosofia cínica da Antigüidade (Antístenes de Atenas - 444-365 a.C e Diógenes de Sinope - 400-325 a.C.), mas não vou explorar este lado da questão. O abraço silencioso de um velho doente com as suas árvores de estimação repete a idéia de que todos somos filhos de um único criador e assim, como produto da mesma matéria, somos todos iguais. Não só homens e macacos, mas homens, macacos, ratos, bactérias etc.
Meus piolhos então indagando se é por causa dessa igualdade que o homem (ou melhor: o governo americano) gasta milhões de dólares para saber se existem bactérias ou água em Marte. Também é por isto. Lutamos para encontrar semelhantes fora da terra, nem que sejam bactérias, não importando que os nossos semelhantes aqui na terra estejam passando fome.
THOREAU foi pioneiro nas questões ambientais, mas suas idéias somente hoje começam a vingar. Não é de se admirar a crescente preocupação que existe com o emprego de animais como cobaias. Nem a Bíblia dispensou o uso de cobaias em substituição aos homens. Naquele episódio em que ABRÃO se vê obrigado a matar o seu próprio filho, foi uma cobaia (no caso, um carneiro) que substituiu o sacrifício humano. Somos iguais, mas ainda sigo preferindo que existam carneiros que substituam o sacrifício do único filho de Abraão. Isto é uma questão polêmica…
THOREAU é um dos americanos que mais influenciou o mundo. Muitos de seus ideais continuam vivos em folha (nem que sejam em folha de papel).
Então, vamos encontrar os fios dessa meada e ligá-lo finalmente ao PAI DE SARAMAGO e ao ato do aluno que invocou a objeção de consciência no Rio Grande do Sul.
A objeção de consciência é um ato de desobediência civil, que encontra ressonância direta nos escritos de THOREAU. E THOREAU está, por sua vez, ligado ao pai de SARAMAGO. Vou demonstrar isso…
Poucos anos depois de se formar em HAVARD, THOREAU exila-se voluntariamente na fazenda Walden Pond, onde por 2 anos, num ato de crítica aos costumes da sociedade americana de então, começa a viver em sintonia com a natureza, preanunciando a necessidade de se defender o meio ambiente mais de um século antes dos movimentos ecológicos do final no séc. XX. Ele chegou a trabalhar até como jardineiro. Antes disso, THOREAU já havia demonstrado a sua personalidade contestadora, quando deixou de ensinar porque se recusava a aplicar castigos corporais em seus alunos.
Assim como o pai de SARAMAGO, THOREAU apaixonou-se por um carvalho. É isso mesmo o que você está lendo. THOREAU se declarou apaixonado por uma árvore. É de sua autoria a frase: “encontrei, finalmente, um par para mim: apaixonei-me por um carvalho”. Quem sabe THOREAU não tenha se despedido da árvore pela qual se apaixonou também com um carinhoso abraço?
THOREAU não somente era um pacifista, amigo da natureza. Ele também escreveu o clássico Desobediência Civil, texto que influenciou GANDHI, MARTIN LUTHER KING e tantos outros líderes mundiais (quem sabe também tenha influenciado o pai de SARAMAGO?).
Concluo dizendo que o ato do aluno que se recusou a usar cobaias em suas aulas de biologia (como escrevi noutra postagem), ou mesmo o ato do pai de Saramago, encontram em THOREAU a sua paternidade mais evidente.
Para encerrar as notas a essa personagem incrível, trago aqui algumas frases célebres de THOREAU:
“Se você já construiu castelos no ar, não tenha vergonha deles. Estão onde devem estar. Agora, dê-lhes alicerces.”
“As coisas não mudam. Nós é que mudamos.”
“Um homem é rico na proporção do número de coisas que pode dispensar.”
“Quem mata o tempo injuria a eternidade.”
“Encontrei, finalmente, um par para mim: apaixonei-me por um carvalho”.

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