sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Sistema jurisdicional e erro médico

5 08 2008
Um amigo que cursa medicina escreveu-me dizendo que seu professor não concorda plenamente que um juiz de direito julgue médicos. O meu amigo queria saber então o que penso sobre a criação de um “tribunal” para julgar médicos.
Disse-lhe que a sua questão era interessante, porque no ponto de vista acadêmico é inteiramente permitido fazer este tipo de indagação e então iniciar uma reflexão sobre os motivos pelos quais não poderíamos admitir a criação de um Tribunal dessa ordem.
Primeiramente, entendo que a colocação do problema é inteiramente pertinente no âmbito acadêmico, nada impedindo que se escreva sobre o assunto.
Por outro lado, analisando a proposição diante de um ponto de vista mais realista, tendo em consideração a estrutura judiciária já existente, seria fácil afirmar que a idéia não terá muita aceitação no meio jurídico. Mas para que serve a academia, senão para desafiar as estruturas judiciárias existentes?
A indagação não deixou claro se desejaria criar-se um tribunal não-jurisdicional (como existe na justiça desportiva) ou se defende a criação de um tribunal jurisdicional.
No tocante ao “tribunal” ou a um órgão semelhante não-jurisdicional, acredito que os conselhos de medicina já exercem esse papel. Seria o caso de se discutir um emendar constitucional para permitir que o caso seja levado aos tribunais jurisdicionais depois da apreciação do caso pelo conselho.
Com relação à criação de tribunal ou órgão jurisdicional (a exemplo do que acontece com a Justiça do Trabalho), é possível que o legislador constituinte crie outros jurisdicionais, dentro da estrutura do judiciário, conforme queira dar maior proteção a certos bens jurídicos.
Observe que nós temos uma estrutura de justiça do trabalho criada para proteger o trabalhador. Nós também temos micro-sistemas legais que buscam proteger a criança e o adolescente (Varas da Infância e Juventude) ou as mulheres (Varas da Violência Doméstica). Nada impede que o legislador crie micro-sistemas normativos para a proteção da relação médico-paciente, conforme a particularidade do caso.
Vejo que a questão está no âmbito da opção do legislador. Mesmo que não se crie estruturas judiciárias específicas para os casos de erro médico (o que seria muito difícil, já que o número de casos talvez não justificasse a medida), seria possível criar órgãos jurisdicionais (até mesmo coletivos, funcionando nos próprios hospitais, a exemplo do que acontece com os juizados especiais), próprios para o tratamento do erro médico, até com a participação de médicos e cidadãos leigos na composição.
O erro médico possui particularidades que podem justificar um tratamento especial da legislação. Cada categoria profissional está suscetível a prática de certas condutas, que por representarem desvio regular da função, enquadram-se na esfera dos ilícitos penais, mas também aos ilícitos civis.
A doutrina convencionou denominar “crimes do jaleco branco” os praticados por médicos e seus auxiliares, no exercício de suas funções, ou seja, são os provenientes de ato médico em sentido abrangente.
Existem várias leis que criminalizam as condutas dos médicos e nada impede que elas sejam reunidas num único sistema (como no estatuto do idoso, código do consumidor etc).
Deve o direito inclinar-se à medicina? Esta foi a pergunta do legista paraibano Genival Veloso França que ainda precisa ser respondida… O certo é que haverá casos segundo os quais o direito estará apenas aparentemente superado. Age imprudentemente o médico que durante intervenção cirúrgica, impossibilitado de suturar tecidos cardíacos, cola-os com cola super bond (produto de uso doméstico)? Sob os olhos da razão, a morte deste paciente seria fatal para o médico. Como haveria ele de justificar sua prudência? Mas, na verdade, o caso relatado ocorreu no Brasil, tendo o paciente sobrevivido com sucesso ao inédito recurso, sobre o qual não se guardou sigilo.
Falar em princípios éticos ou cumprimento de normas técnicas nem sempre prestam ao médico, cuja decisão irreversível surge repentinamente, já na mesa de cirurgia, exigindo decisão imediata.
E se é correto afirmar que as demandas judiciais em face dos médicos têm aumentado abruptamente, este fato resulta da colocação do paciente em uma verdadeira linha de produção. Não se procura estes profissionais apenas para tratar da saúde. A industria da estética sobreleva os ganhos e em igual proporcionalidade as causas judiciais.
Está aqui minha opinião.

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