sexta-feira, 19 de setembro de 2008

Ministro grapeado, pobre espiado…tem de tudo no Big Pobre Brasil

10 09 2008

Está em evidência o assunto dos grampos da autoridades do alto escalão governamental. Vou então pegar o gancho das idéias de baixo escalão penal. Entenderão? Não? Ou seja, começarei a explicar-me com uma proposta político-criminal que está em voga no momento: a prevenção situacional.
ACM Neto está na frente das pesquisas eleitorais para a prefeitura de Salvador, depois que um dos candidatos desistiu surpreendentemente da disputa. O interessante é que um dos seus principais projetos para a cidade chama-se BIG BROTHER BAIRROS. Logo este projeto, Neto?
A oposição ironizou ACM NETO por ele propor um projeto como esses; é que o seu avó protagonizou o episódio de grampo telefônico e espionagem no Senado. ACM AVÔ foi um político implacável com seus adversários, contra os quais suscitava o uso de dossiês e informações obtidas na contra-espionagem. Já seu Neto segue caminho mais modesto…explicaremos….
O BIG BROTHER BAIRROS propõe reduzir a criminalidade por meio da instalações de câmeras de vídeo nos bairros periféricos. Enfim, é um projeto de alcovitagem… de espionagem barata, coisa pouca mesmo, perto das histórias de grampo que rondam os corredores de Brasília. Várias cidades no Brasil já possuem projetos semelhantes com bons resultados no combate da criminalidade. Nesta campanha todo político promete proteger a sociedade com tais câmeras.
Tecnicamente, o nome da medida é “prevenção situacional”; essas idéias guardam resquício remoto na Escola de Chicago, mas recentemente floresceram na Inglaterra. A prevenção situacional é uma medida de política criminal que busca combater o crime não pelo sistema penal tradicional, mas sim por um estado de vigilância cinematográfico. O garantismo rejeita piamente ações como essas, mas não quero agora entrar nesta linha de pensamento.
O que me interessa é o seguinte: ACM NETO é um dos deputados mais esbravejadores do Congresso e abertamente ligado a idéias de Estado mínimo. Ops, mínimo no que diz respeito à economia e a política criminal da policia federal contra as “pessoas de bem” da sociedade.
Agora, o tal BIG BROTHER BAIRROS é uma política de Estado polícia, eficaz contra a criminalidade miúda nos bairros da periferia empobrecida. É um projeto pobre para pobres. Pra que combater a criminalidade com boas escolas e projetos sociais caros? A sociedade em crise precisa levar o progresso para o morro e, neste caso, isso significa pendurar um câmera num poste, mesmo que o dito aparelho não funcione ou funcione mal.
E é melhor que não funcione. Até sugiro que a câmera seja um imitação feita com caixa de sapato. Isso gera renda (esta frase é doce na boca de muita gente). Já estou imaginando a reportagem no programa crianças esperança da rede globo: uma centena de crianças fabricando as câmeras de papel.
Faz tempo que perdeu a graça assistir pela TV as filmagens de corrupção. Como as filmagens de verdade estão perdendo a graça, uma câmera de papel surte o mesmo efeito. É o que fizeram com os pardais em São Paulo. Lembram daqueles bonecos espalhados pela cidade imitando agentes de trânsito? Isto é uma forma de prevenção à criminalidade… Isto também pode se chamar prevenção situacional. A sociedade em crise tem cada uma…
Como visto, o discurso de Estado mínimo nem sempre está acompanhado do direito penal mínimo. Fique de olho eleitor, porque alguém pode estar de olho em você. Fui. Aliás, não vou; prefiro antes terminar com Drummond:
Mundo grande
Não, meu coração não é maior que o mundo.É muito menor.Nele não cabem nem as minhas dores.Por isso gosto tanto de me contar.Por isso me dispo,por isso me grito,por isso freqüento os jornais, me exponho cruamente nas livrarias:preciso de todos.
Sim, meu coração é muito pequeno.Só agora vejo que nele não cabem os homens.Os homens estão cá fora, estão na rua.A rua é enorme. Maior, muito maior do que eu esperava.Mas também a rua não cabe todos os homens.A rua é menor que o mundo.O mundo é grande.
Tu sabes como é grande o mundo.Conheces os navios que levam petróleo e livros, carne e algodão.Viste as diferentes cores dos homens,as diferentes dores dos homens,sabes como é difícil sofrer tudo isso, amontoar tudo issonum só peito de homem… sem que ele estale.
Fecha os olhos e esquece.Escuta a água nos vidros,tão calma, não anuncia nada.Entretanto escorre nas mãos,tão calma! Vai inundando tudo…Renascerão as cidades submersas?Os homens submersos – voltarão?
Meu coração não sabe.Estúpido, ridículo e frágil é meu coração.Só agora descubrocomo é triste ignorar certas coisas.(Na solidão de indivíduodesaprendi a linguagemcom que homens se comunicam.)
Outrora escutei os anjos,as sonatas, os poemas, as confissões patéticas.Nunca escutei voz de gente.Em verdade sou muito pobre.
Outrora viajeipaíses imaginários, fáceis de habitar,ilhas sem problemas, não obstante exaustivas e convocando ao suicídio.
Meus amigos foram às ilhas.Ilhas perdem o homem.Entretanto alguns se salvaram etrouxeram a notíciade que o mundo, o grande mundo está crescendo todos os dias,entre o fogo e o amor.
Então, meu coração também pode crescer.Entre o amor e o fogo,entre a vida e o fogo,meu coração cresce dez metros e explode.– Ó vida futura! Nós te criaremos.
Carlos Drummond de Andrade

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